Instruções Gerais para interpretação de textos
Em primeiro lugar,
você deve ter em mente que interpretação de textos em testes de
múltipla escolha pressupõe armadilhas da banca. Isso significa dizer que
as questões são montadas de modo a induzir o incauto e sofrido
vestibulando ao erro. Nesse sentido, é importante observar os comandos
da questão (de acordo com o texto, conforme o texto, segundo o
autor...). Se forem esses os comandos, você deve-se limitar à realidade
do texto. Muitas vezes, as alternativas extrapolam as verdades do texto;
ou ainda diminuem essas mesmas verdades; ou fazem afirmações que nem de
longe estão no texto.
Exemplo de exercício editorial que caiu na prova da UFRGS
Em 1952, inspirado nas descrições do viajante Hans Staden, o alemão De Bry desenhou as cerimônias de canibalismo de índios brasileiros. São documentos de alto valor histórico (...)
Porém não podem ser vistos como retratos exatos: o artista, sob influência do Renascimento, mitigou a violência antropofágica com imagens idealizadas de índios, que ganharam traços e corpos esbeltos de europeus. As índias ficaram rechonchudas como as divas sensuais do pintor holandês Rubens.No século XX, o pintor brasileiro Portinari trabalhou o mesmo tema. Utilizando formas densas, rudes e nada idealizadas, Portinari evitou o ângulo do colonizador e procurou não fazer julgamentos. A Antropologia persegue a mesma coisa: investigar, descrever e interpretar as culturas em toda a sua diversidade desconcertante.Assim, ela é capaz de revelar que o canibalismo é uma experiência simbólica e transcendental - jamais alimentar.Até os anos 50, waris e kaxinawás comiam pedaços dos corpos dos seus mortos. Ainda hoje, os ianomâmis misturam as cinzas dos amigos no purê de banana. Ao observar esses rituais, a Antropologia aprendeu que, na antropogafia que chegou ao século XX, o que há é um ato amoroso e religioso, destinado a ajudar a alma do morto a alcançar o céu. A SUPER, ao contar toda a história a você, pretende superar os olhares preconceituosos, ampliar o conhecimento que os brasileiros têm do Brasil e estimular o respeito às culturas indígenas. Você vai ver que o canibalismo, para os índios, é tão digno quanto a eucaristia para os católicos. É sagrado. (adaptado de: Superinteressante, agosto, 1997, p.4)
Questão da prova
Considere as seguintes informações sobre o texto:
I - Segundo o próprio autor do texto,
a revista tem como único objetivo tornar o leitor mais informado acerca
da história dos índios brasileiros.
II - Este texto introduz um artigo jornalístico sobre o canibalismo entre índios brasileiros.
III - Um dos principais assuntos do texto é a história da arte no Brasil.
Quais são corretas?
a) Apenas I
b) Apenas II
c) Apenas III
d) Apenas I e III
e) Apenas II e III
b) Apenas II
c) Apenas III
d) Apenas I e III
e) Apenas II e III
Resposta correta: B
Comentários:
A afirmação I usa a palavra único, o
vestibulando deve cuidar muito com essa palavrinha, geralmente ela traz
uma armadilha. A afirmação reduz o texto, que vai bem além de ter como
único objetivo informar sobre a história dos índios. Aliás, não é a
história dos índios, mas sim da antropofagia deles.
A afirmação III está erradíssima, pois a história da arte está longe de ser um dos assuntos principais do texto.
Essas afirmações da banca merecem
algumas observações. Em primeiro lugar, a afirmação I diz: "Segundo o
próprio autor do texto". Mas quem é esse autor, tendo em vista que se
trata de editorial? Não há um autor expresso.
A afirmação II, considerada como
certa, traz uma imprecisão. O texto não introduz um artigo jornalístico.
Como vimos, artigo é bem diferente. O editorial introduz matéria ou
reportagem, nunca um artigo. Percebe-se aqui que os professores que
elaboraram o texto desconhecem a tipologia e a nomenclatura textual do
moderno jornalismo.
Outros exercícios de interpretação de texto:
Vamos aproveitar os textos das provas
da UFRGS 2000 e 1999, para formularmos algumas questões bem
emblemáticas em relação à interpretação de textos.
Questão 1
Qual das alternativas abaixo é a correta:
No Brasil colonial, os portugueses e
suas autoridades evitaram a concentração de escravos de uma mesma etnia
nas propriedades e nos navios negreiros.
A) Os portugueses impediram totalmente a concentração de escravos de mesma etnia nas propriedades e nos navios negreiros.
Essa política, a multiplicidade
lingüística dos negros e as hostilidades recíprocas que trouxeram da
África dificultaram a formação de núcleos solidários que retivessem o
patrimônio cultural africano, incluindo-se aí a preservação das línguas.
B) A política dos portugueses foi
ineficiente, pois apenas a multiplicidade cultural dos negros, de fato,
impediu a formação de núcleos solidários.
Os negros, porém, ao longo de todo o
período colonial, tentaram superar a diversidade de culturas que os
dividia, juntando fragmentos das mesmas mediante procedimentos diversos,
entre eles a formação de quilombos e a realização de batuques e
calundus. (...)
C) A única forma que os negros
encontraram para impedir essa ação dos portugueses foi formando
quilombos e realizando batuques e calundus.
As autoridades procuraram evitar a
formação desses núcleos solidários, quer destruindo os quilombos, que
causavam pavor aos agentes da Coroa - e, de resto, aos proprietários de
escravos em geral -, quer reprimindo os batuques e os calundus
promovidos pelos negros. Sob a identidade cultural, poderiam gerar uma
consciência danosa para a ordem colonial. Por isso, capitães-do-mato, o
Juízo Eclesiástico e, com menos empenho, a Inquisição foram colocados em
seu encalço.
D) A Inquisição não se empenhou em reprimir a cultura dos negros, porque estava ocupada com ações maiores.
Porém alguns senhores aceitaram as
práticas culturais africanas - e indígenas - como um mal necessário à
manutenção dos escravos. Pelo imperativo de convertê-los ao catolicismo,
ainda, alguns clérigos aprenderam as línguas africanas, como um jesuíta
na Bahia e o padre Vieira, ambos no Seiscentos. Outras pessoas, por se
envolverem no tráfico negreiro ou viverem na África - como Matias
Moreira, residente em Angola no final do Quinhentos -, devem igualmente
ter-se familiarizado com as línguas dos negros.
E) Apesar do empenho dos portugueses,
a cultura africana teve penetração entre alguns senhores e entre alguns
clérigos. Cada um, é bem verdade, tinha objetivos específicos para
tanto.
(Adaptado de: VILLALTA, Luiz Carlos. O
que se fala e o que se lê: língua, instrução e leitura. In: MELLO e
SOUZA. História da Vida Privada no Brasil. São Paulo: Cia. das Letras,
1997. V1. P.341-342.)
Resposta:
A) Observe o advérbio totalmente.
Além disso, o texto usa o verbo evitar, a afirmação utiliza impedir.
Eles são semanticamente bem distintos. Logo, a afirmação exagera,
extrapola o texto. Cuidado com os advérbios.
B) A afirmativa b diz apenas a
multiplicidade cultural dos negros. No texto, foram a multiplicidade e
as hostilidades recíprocas. Portanto, a afirmativa b reduz a verdade do
texto.
C) Na afirmativa, há a expressão a
única forma, e o texto usa entre eles. Novamente, temos uma redução, uma
diminuição da verdade textual.
D) O texto não explica a falta de
empenho da Inquisição, dessa maneira a afirmação não está no texto.
Trata-se de um acréscimo à realidade textual.
E) Resposta Correta.
Questão 2
Assinale a alternativa que apresenta uma afirmação correta de acordo com o texto.
A) Sendo a cultura negra um mal
necessário para a manutenção dos escravos, sua eliminação foi um erro
das autoridades coloniais portuguesas.
B) Os religiosos eram autoritários,
obrigando os escravos negros a se converterem ao catolicismo europeu e a
abandonarem sua religião de origem.
C) As autoridades portuguesas
conduziam a política escravagista de modo que africanos de uma mesma
origem não permanecessem juntos.
D) As línguas africanas foram
eliminadas no Brasil colonial, tendo os escravos preservado apenas
alguns traços culturais, como sua religião.
E) A identidade cultural africana, representada pelos batuques e calundus, causava danos às pessoas de origem européia.
Resposta:
A) O texto não classifica como erro
das autoridades coloniais. Essa é uma inferência que o leitor poderá
fazer por sua conta e risco.
B) O autoritarismo era dos
proprietários de escravos e das autoridades. Busca-se aqui confundir o
aluno dizendo que era o autoritarismo dos religiosos. Há uma troca, uma
inversão das afirmações do texto.
C) Resposta Correta: Essa afirmação está no texto.
D) A afirmação contradiz o que está no texto. As línguas africanas foram, inclusive, aprendidas por alguns clérigos.
E) A afirmação exagera a verdade
textual. O autor não chega a tanto. Se o vestibulando chegar a essa
conclusão é por sua conta e risco.
Questão 03
Marque a alternativa correta, segundo o texto
O avanço do conhecimento é
normalmente concebido como um processo linear, inexorável, em que as
descobertas são aclamadas tão logo venham à luz, e no qual as novas
teorias se impõem com base na evidência racional. Afastados os entraves
da religião desde o século 17, o conhecimento vem florescendo de maneira
livre, contínua.
a) O avanço do conhecimento sempre será por um processo linear, do contrário não será avanço.
Um pequeno livro agora publicado no
Brasil mostra que nem sempre é assim. Escrito na juventude (1924) pelo
romancista francês Louis-Ferdinand Céline, A Vida e a Obra de Semmelweis
relata aquele que é um dos episódios mais lúgubres no crônica da
estupidez humana e talvez a pior mancha na história da medicina.
b) O episódio de Semmelweis é indiscutivelmente a pior mancha na história da medicina.
c) O livro de Céline prova que nem sempre a racionalidade preponderava no cientificismo.
Ignác Semmelweis foi o descobridor da
assepsia. Médico húngaro trabalhando num hospital de Viena, constatou
que a mortalidade entre as parturientes, então um verdadeiro flagelo,
era diferente nas duas alas da maternidade. Numa delas, os partos eram
realizados por estudantes; na outra, por parteiras.
Não se conhecia a ação dos
microorganismos, e a febre puerperal era atribuída às causas mais
estapafúrdias. Em 1846, um colega de Semmelweis se cortou enquanto
dissecava um cadáver, contraiu uma infecção e morreu. Semmelweis
imaginou que o contágio estivesse associado à manipulação de tecidos nas
aulas de anatomia.
Mandou instalar pias na ala dos
estudantes e tornou obrigatório lavar as mãos com cloreto de cal. No mês
seguinte, a mortalidade entre as mulheres caiu para 0,2%! Mais incrível
é o que aconteceu em seguida. Os dados de Semmelweis foram desmentidos,
ele foi exonerado, e as pias - atribuídas à superstição -, arrancadas.
d) A ala dos estudantes apresentava menores problemas de contágio.
Nos dez anos seguintes, Semmelweis
tentou alertar os médicos em toda a Europa, sem sucesso. A Academia de
Paris rejeitou seu método em 1858. Semmelweis enlouqueceu e foi
internado. Em 1865, invadiu uma sala de dissecação, feriu-se com o
bisturi e morreu infeccionado. Pouco depois, Pasteur provou que ele
estava certo.
e) A rejeição aos métodos de Semmelweis ocorreu em função da inveja comum ao meio.
Para o leitor da nossa época, o
interessante é que Semmelweis foi vítima de um obscurantismo científico.
Como nota o tradutor italiano no prefácio agregado à edição brasileira,
qualquer xamã de alguma cultura dita primitiva isolaria cadáveres e
úteros por meio de rituais de purificação. No científico século 19, isso
parecia crendice.
(Adaptado de: FRIAS FILHO, Otávio. Ciência e superstição. Folha de S. Paulo, São Paulo 30 abril de 1998.)
Vocabulário
Inexorável - inabalável - inflexível
Lúgubre - triste - sombrio - sinistro
Estapafúrdia - extravagante - excêntrico - esdrúxulo -
Obscurantismo - oposição ao conhecimento - política de fazer algo para impedir o esclarecimento das massas
Lúgubre - triste - sombrio - sinistro
Estapafúrdia - extravagante - excêntrico - esdrúxulo -
Obscurantismo - oposição ao conhecimento - política de fazer algo para impedir o esclarecimento das massas
Resposta:
Atente para este texto: trata-se de
um artigo jornalístico. Observe como ele atende às características
assinaladas na tipologia textual do jornalismo.
A) Observe que o texto usa o advérbio normalmente, mas a afirmação emprega sempre, mudando a verdade do texto.
B) Novamente, se compararmos com o
texto, veremos que o autor afirma que o episódio talvez seja a pior
mancha da história. Na afirmação, foi usado o advérbio indiscutivelmente
acrescido de a pior mancha. Trata-se de um exagero, um acréscimo à
realidade do texto.
C) Resposta Correta: O texto afirma que nem sempre o avanço do conhecimento é um processo linear.
D) A ala dos estudantes apresentava
maiores problemas de contágio, pois as pias foram instaladas lá,
justamente para lavar as mãos dos estudantes que trabalhavam na
dissecação de cadáveres.
E) A inveja não é abordada pelo
texto, portanto trata-se de uma exterioridade. O vestibulando pode achar
verdadeiro, mas a conclusão será pessoal
Instruções para as próximas questões: As
questões 4 e 5 devem merecer atenção. Estamos diante de questões de
inferências. As alternativas corretas não estão propriamente no texto,
mas poderemos chegar facilmente a elas, ou seja, o autor nos autoriza a
concluir por elas.
Questão 04
O avanço do conhecimento é
normalmente concebido como um processo linear, inexorável, em que as
descobertas são aclamadas tão logo venham à luz, e no qual as novas
teorias se impõem com base na evidência racional. Afastados os entraves
da religião desde o século 17, o conhecimento vem florescendo de maneira
livre, contínua.
Com base no texto, assinale a alternativa correta.
(A) Em relação aos povos primitivos, a Europa do século passado praticava uma medicina atrasada.
(B) A comunidade científica sempre deixa de reconhecer o valor de uma descoberta.
(C) A higiene das mãos com cloreto de cal reduziu moderadamente a incidência de febre puerperal.
(D) Semmelweis feriu-se com o bisturi infectado porque queria provar a importância de sua descoberta.
(E) Ignorar a redução nas estatísticas obituárias resultante da introdução da assepsia foi uma grande estupidez.
Resposta:
A) O autor não classifica de atrasada a medicina européia da época.
B) Novamente o advérbio colocado para trair a atenção do aluno: sempre. Trata-se de um acréscimo, de um exagero.
C) Não foi moderadamente. De novo o
advérbio. Veja como as armadilhas são sempre as mesmas. Se você as
conhecer, ficará bem mais fácil chegar à resposta correta.
D) O texto simplesmente diz que ele se feriu. Não dá as causas.
E) Resposta Correta: Foi de fato uma
estupidez. Essa é uma conclusão possível do texto. Observe que o autor
declara: "Mais incrível é o que aconteceu em seguida".
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